segunda-feira, 14 de abril de 2014

Mar

  A dias assim. Que erro meu caminho. Que me sento nas pedras e fico a observar o mar. A ouvir sua canção. Suas histórias, suas calmarias e suas tormentas. 
Dia assim gosto de sentir o cheiro. Os pés molhados. De sentir o mar me purificando. Levando embora meus amores, minhas raivas, meu desprezo. Levando embora, minhas qualidades e defeitos... Minha tristeza, minha coragem, minha dor, minha noção de tempo. Me sinto vazio, fora do tempo. Meus escudos caem, meu dragão se torna completamente livre. Vento, caos e solidão. O mar leva minha humanidade, meu dragão. 
  Nada importa... Nada. Nem mesmo pensamentos cruzam minha mente. Puxar e empurrar. Assim aos poucos o mar me purifica. Puxar e empurrar. Estou perdido, no tempo, sem memorias, sem passado ou futuro. Sem desejos, sem amores, sem rancores. A noite chega e o vento vem me chamar pelo nome. Vem me dizer que é hora de ir. Meu dragão volta pra mim. Um espirito antigo. Que se importa tanto com os humanos quanto nos importamos pelas formigas da Africa, que busca prazeres, magia, sangue... Que segue ao meu lado.  Por que quando eu desistir, ou mesmo fraquejar, ele me dominará. O bruxo morrerá e só restará o dragão em meu corpo...
  Mas ainda não será essa noite. Essa noite ele será meu manto, negro como a noite e frio como o vento. O manto que não aquece, mas que escode minha presença de amigos e inimigos. Aos poucos em meu caminho de volta os sentimentos e pensamentos vão voltando. Antes de terminar de subir as pedras e voltar para a calçada me despeço do mar.

- Quer que eu leve algum recado?
- Nenhum que palavras sejam necessárias...

Com uma risada o mar ruge e vento me joga gotas de água na nuca... 
A voz de meu dragão voltou a ser clara e gutural.

- Ela decidirá te chamar. Quando você não puder mais ir. E ainda dirá a se mesmo que tentou...
- ...

Minha aura se torna violenta. Minha doce aura negra se expande furiosa... Um motoqueiro que passava perto cai.

- Gostei da aura. Há anos não usamos magia como se deve... 
- ...

Uma velha me olha assustada, faz o sinal da cruz e sai apressada. Talvez ela consiga ver meu dragão em forma de capa ou mesmo seja capaz de sentir a aura negra ao meu redor... Por essa noite não há dor, ou tristeza, apenas fúria, violência e solidão...



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